M, o Vampiro de Dusseldorf (1931) - Hans Beckert e a representação do psicopata de perfil impulsivo
Direção: Fritz Lang
Roteiristas: Thea von Harbou, Fritz Lang e Egon Jacobsohn
País: Alemanha
Duração: 1h:57min
Considerado uma obra-prima absoluta do expressionismo alemão e um marco fundacional do suspense moderno, M - O Vampiro de Düsseldorf (1931), de Fritz Lang, é muito mais do que um filme sobre a caça a um criminoso. É um estudo sociológico e psicológico que, mesmo quase um século após seu lançamento, permanece como uma das representações mais precisas e perturbadoras da psicopatia e da compulsão no cinema. No centro desta narrativa sombria está Hans Beckert, interpretado por Peter Lorre em uma atuação que definiu sua carreira e estabeleceu o padrão para os vilões complexos que viriam a seguir.
Diferente de Anton Chigurh (analisado em outra postagem), que opera sob uma lógica fria e mecânica, Hans Beckert personifica o que a psiquiatria forense classifica como um psicopata de perfil impulsivo e atormentado. A construção do personagem é inovadora por não apresentá-lo como um monstro bidimensional, mas como um homem aparentemente comum que esconde uma natureza predatória incontrolável. Lang utiliza recursos visuais e sonoros — como o famoso assobio de In the Hall of the Mountain King — para sinalizar a emergência do "outro" dentro de Beckert. O assobio não é apenas um tema musical; é o gatilho auditivo de sua psicose e o sinal de que sua compulsão assumiu o controle.
| Imagem/Reprodução: Imdb |
A profundidade da psicopatia de Beckert é revelada com maestria na icônica cena do "julgamento" pelo submundo do crime. Enquanto os criminosos comuns o julgam sob uma lógica de lucro ou honra deturpada, Beckert entra em um colapso emocional que expõe a essência de sua condição. Ele grita: "Eu não posso evitar! Eu não tenho controle sobre isso!". Do ponto de vista clínico, isso ilustra a dissociação entre o ato e a vontade. Enquanto o psicopata clássico muitas vezes planeja com total ausência de emoção, Beckert é movido por uma força interna que ele mesmo não compreende totalmente, mas que o leva a cometer atos de crueldade extrema sem qualquer resquício de empatia pelas vítimas.
A cinematografia de Lang reforça essa fragmentação psíquica. O uso constante de espelhos e reflexos sugere a dualidade de Beckert: o cidadão que toma café e o assassino que caça nas sombras. O filme evita o sangue explícito, focando no terror psicológico da antecipação, o que torna a patologia do personagem ainda mais vívida para o público. A "marca" de giz com a letra M em suas costas funciona como uma metáfora para a estigmatização da doença mental e a impossibilidade de Beckert se esconder de sua própria natureza.
Ao final, M desafia o espectador com um dilema ético: Beckert é um monstro que merece a morte ou um homem doente que deveria ser tratado? Ao dar atenção especial aos traços de psicopatia compulsiva de Beckert, Fritz Lang criou um documento humano sobre o horror que reside no ordinário. O filme não apenas lançou as bases para o cinema noir e os thrillers de serial killers, mas permanece como uma análise atemporal sobre como a sociedade reage ao que não consegue classificar ou curar.
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